terça-feira, 12 de abril de 2011

Emoção e preconceito

Por Carlos Brickmann em 12/4/2011

É difícil cobrir uma tragédia como a do Rio: há a emoção, a competição, as informações desencontradas, as autoridades loucas por um holofote falando aquilo que lhes vem primeiro à cabeça para garantir seu espaço nas notícias. Nesse clima tenso, envenenado, muita bobagem acaba achando seu espaço.
Preconceito, por exemplo. No noticiário do primeiro dia, já se destilou preconceito contra ateus, contra quem não partilha os valores cristãos, homossexuais, soropositivos, nerds, muçulmanos fundamentalistas, pastores evangélicos que teriam influenciado o assassino com seu fundamentalismo bíblico. Dentro da imprensa, um grupo de jornalistas chegou a discutir os limites da cobertura de uma tragédia desse tipo, para evitar que malucos diversos, para alcançar alguns instantes de notoriedade, saiam matando gente por aí. Houve até quem sugerisse que tragédias como essa fossem noticiadas omitindo-se o nome do assassino, evitando a publicação de sua foto. Sabendo que não alcançaria a fama, talvez muita gente se contivesse.
É um tema que vale discutir, embora este colunista ache que sempre haverá alguém disposto, para levar vantagem, a violar o que tenha sido combinado. Mas também vale a pena discutir o tema do preconceito: no Brasil, o preconceito de etnia, de religião, de todos os tipos está ainda arraigado.
Não faz muito tempo, a torcida de um time de futebol, por considerar que um jogador era homossexual, discriminou-o fortemente, a ponto de nem mencionar seu nome. E agora mesmo um jogador de vôlei se sentiu obrigado a proclamar publicamente sua homossexualidade depois de um jogo em que o estádio inteiro gritava “bicha, bicha” sempre que ele tocava a bola. O deputado federal Jair Bolsonaro agora diz que não era o que queria dizer, mas o que disse é que um filho seu não namoraria uma negra porque tinha sido bem educado e não vivia num ambiente promíscuo. Um americano, judeu, decidiu processar o criador do Facebook, Mark Zuckerberg, também judeu, por não ter eliminado imediatamente uma página que pregava a violência no Oriente Médio. O título da notícia já identifica o autor do processo não como americano, nem como ativista, nem como militante, mas como “judeu”. E, nos comentários, há coisas como “Eles que são judeus que se entendam”.
Não é chamando negro de afrodescendente que o preconceito vai desaparecer.
É difícil, no calor da cobertura, distinguir uma opinião fundada de um caso de preconceito. A história do fundamentalismo islâmico, por exemplo, se baseava exclusivamente na barba que o rapaz teria deixado crescer (e que, conforme dizem, raspou na véspera do crime) e em comentários esporádicos de que gostaria de destruir grandes alvos, como ocorreu no 11 de setembro. Seria, claro, o primeiro caso de fundamentalista islâmico apelar a Jesus, como está em sua carta de suicídio, e não a Alá. Já a história do homossexualismo tem outra origem: ele matou mais meninas do que garotos, portanto não gostava de mulheres e tinha mais consideração por homens. E gostava muito de computadores, logo... e seu melhor amigo, nos tempos de escola, era fanho... e tinha o apelido de Swing, porque mancava de uma perna... e sua mãe biológica, que ninguém ali conhecia, certamente era louca... e, com diagnóstico positivo de Aids, decidira vingar-se das humilhações que havia passado naquela escola... A história de Aids, a propósito, não se sabe de onde apareceu.
Cuidado, pois: quem tem preconceito sempre busca espalhá-lo, conscientemente ou não. E a imprensa pode se tornar o amplificador dos preconceituosos.

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